Exclusivo/Centronave: Vedar a participação de atuais operadores no Tecon 10 é contraproducente

Por Luiz Araújo
Brasília, 03/12/2025 – O Centronave, entidade que representa 19 empresas de navegação responsáveis por cerca de 97% da movimentação de contêineres do comércio exterior brasileiro, elaborou uma nota em que critica a proposta de restrição de participantes no leilão do Tecon 10, futuro terminal de contêineres de Santos. A manifestação conjunta, sem precedentes recentes no setor, foi obtida com exclusividade pela Broadcast.
Para o Centronave, o voto divergente apresentado pelo relator revisor no Tribunal de Contas da União, ministro Bruno Dantas, desvirtua o debate, ignora um conjunto de técnicos e, por fim, penaliza o setor. O julgamento em curso no TCU foi suspenso por pedido de vista e está previsto para ser retomado na próxima semana. O que se discute é a possibilidade de os atuais operadores do Porto de Santos participarem do leilão do novo terminal.
Em linha com o projeto elaborado pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), o relator revisor afirmou ver risco de concentração de mercado e, indo além, propõe vetar que empresas de navegação, além de operadores de terminais, fiquem de fora da disputa. O voto de Dantas tende a formar maioria, conforme mostrou a Broadcast. Porém, vai na contramão das análises técnicas elaboradas pelo Ministério da Fazenda, pela equipe técnica do próprio TCU e pelo Ministério Público junto ao TCU. Todos dizem que não há razões para restringir a participação de quaisquer interessados.
“Restringir a participação de quem quer investir, sob a premissa de um risco concorrencial que a própria unidade instrutora do TCU (AudPortoFerrovia), o Ministério Público junto ao TCU, o CADE e a Antaq (Nota Técnica nº 51/2025/GRP/SRG) já descartaram tecnicamente, é penalizar a solução em vez de atacar o problema”, afirma o Centronave, que vai além: “A análise do Voto Revisor mostra-se completamente inadequada. Não há fundamento para alegar barreiras ‘quase intransponíveis’ à entrada de operadores independentes, tampouco para impor restrições concorrenciais futuras.”
Crise logística
A entidade afirma que o setor opera em ambiente de “grande competição”, citando a presença de diversas companhias internacionais e nacionais que disputam carga diariamente no complexo santista. O Centronave sustenta que acordos operacionais entre empresas, comuns no setor, são mecanismos reconhecidos por autoridades de defesa da concorrência no Brasil e no exterior e visam eficiência física e redução de custos, e não práticas anticompetitivas.
Noutro ponto, a nota responde à tese de que a omissão de escalas em Santos teria sido usada como estratégia comercial de armadores verticalizados para manipular oferta ou pressionar o mercado. O setor afirma que essa interpretação é “falaciosa” e que a omissão de escala decorre exclusivamente da falta de infraestrutura e de filas de espera que chegam a até quatro dias, incompatíveis com a programação global dos navios. Nesse cenário, argumenta que manter o navio parado significa prejuízo diário que pode superar US$ 100 mil. Ao classificar a omissão como “ato de desespero operacional”, a entidade compara a situação a culpar o piloto quando um aeroporto fecha por falta de pista.
O Centronave também rejeita a alegação de que a verticalização gera fechamento de mercado. Como exemplo, menciona a aprovação sem restrições da aquisição da Santos Brasil por empresa do grupo CMA CGM, após análise profunda dos riscos verticais. A entidade afirma que terminais verticalizados, ao contrário do que sugerem as críticas, dependem de captar carga de terceiros para viabilizar sua operação e, por isso, têm interesse direto na fluidez do sistema.
A nota atribui a atual crise logística em Santos, marcada por filas de navios, omissões de escala e perdas bilionárias, exclusivamente ao déficit de infraestrutura. O documento lembra que o Porto de Santos opera com taxas de ocupação acima de 90%, muito acima do limite de eficiência recomendado pela OCDE, de aproximadamente 65%.
Aponta ainda que não há expansão significativa de cais há mais de uma década, enquanto navios cresceram em tamanho e a demanda aumentou. Segundo a entidade, o custo anual do tempo de espera dos navios é estimado em R$ 1,6 bilhão e o País deixa de exportar US$ 20,6 bilhões por falta de capacidade.
Prejuízos
Para o Centronave, restringir a participação de armadores no leilão do Tecon 10 reduzirá a concorrência pelo ativo, diminuirá o valor de outorga, afastará capital privado – nacional e estrangeiro – e não resolverá os riscos de concentração, que seriam “hipotéticos”. A entidade argumenta que o País precisa atrair investimentos para expandir berços e cais e afirma que operadores independentes podem, inclusive, ter incentivos desalinhados para ampliar a infraestrutura, lucrando com a escassez atual.
O documento conclui que o verdadeiro problema do sistema portuário brasileiro não está na estrutura de mercado, mas na insuficiência de infraestrutura. A Centronave reforça que os armadores são “os primeiros a sofrer” com a ineficiência portuária e os maiores interessados em sua solução. A entidade afirma que restringir quem deseja investir, com base em um risco concorrencial já descartado por análises técnicas, significa penalizar potenciais soluções para uma crise que se arrasta há anos.
“O Brasil não precisa de menos concorrentes; precisa de mais berços, mais cais e mais obras. Acreditamos que a segurança jurídica é o caminho seguro para que o Porto de Santos e os portos brasileiros retomem sua trajetória de crescimento, reduzindo o Custo Brasil e servindo ao interesse público”, afirma a entidade. O leilão do Tecon 10 é considerado estratégico por prever R$ 6,45 bilhões em investimentos e ampliar de forma significativa a capacidade do Porto de Santos, responsável por cerca de 30% do comércio exterior brasileiro. A decisão final poderá redefinir o modelo concorrencial para o maior terminal de contêineres projetado no País.